Modelos de dados existem vários. Mas será que existe um modelo canónico que pode ser aplicado na contabilidade?
Os modelos de dados ilustram as entidades de dados, os seus atributos e os respetivos relacionamentos entre as entidades. Já um modelo canónico é um tipo de modelo de dados que apresenta entidades de dados e relacionamentos da forma mais simples possível.
Modelo de dados canónico
É, geralmente, utilizado em processos de integração de sistema / banco de dados, nos quais os dados são trocados entre sistemas diferentes, independentemente da tecnologia utilizada. Também é reconhecido como um modelo de dados comum.
Um modelo de dados canónico permite, principalmente, que uma organização crie e distribua uma definição comum de toda a sua unidade de dados.
De uma forma mais básica, entendo que o modelo canónico de dados é, em si, reconhecido e aceite por todos os intervenientes e permite fazer com que a transferência de informação entre destinatários se faça de forma estruturada.
Chegado aqui, será que o conceito de Modelo Canónico se pode de alguma forma aplicar à área de contabilidade? Se sim de que forma?
O modelo canónico aplicado à contabilidade: é possível?
Durante muito tempo a contabilidade não tinha qualquer modelo estruturado para tratar a informação de forma a ser aceite por todos os stakeholders, sejam eles os donos dos negócios, o Estado, a banca, os colaboradores, clientes ou fornecedores.
Identificada a necessidade, os governos dos diversos países procederam ao estudo e publicação da legislação indicando as normas gerais aplicáveis espelhadas em referenciais contabilísticos.
Em consequência, estes referenciais contabilísticos indicam planos de contas estruturados de acordo com uma ordem das principais operações necessárias na atividade empresarial.
Os planos de contas
A utilização generalizada dos planos de contas para os registos contabilísticos deu início, tal como esperado, à primeira fase da uniformização da informação contabilística.
É verdade que, cada negócio é um negócio e cada empresa é uma empresa, mas as normas contabilísticas permitem ajudar a contar as histórias empresariais de forma estruturada e comparável.
Se repararmos bem, as estruturas dos planos de contas, têm na base um cariz fixo, com sugestão de contas agregadoras e de movimento. Estas permitem o registo de informação com alguma elasticidade sem desvirtuar a história única da empresa, ou seja, reproduzindo uma imagem fiel e apropriada.
Com a informação contabilística identificada na estrutura dos planos de contas esta informação pode ser lida, validada, transferida e ser utilizada por um sem número de stakeholders para produção de diferentes ouputs.
É assim que, durante muito tempo a contabilidade, à sua maneira, tinha um modelo canónico da informação, com base nas contas dos planos de contas.
Este modelo teve uma evolução pausada, nem sempre acompanhando a rápida evolução da atividade empresarial, onde se foram introduzindo conceitos de maior legibilidade e comparabilidade, principalmente, tentando acompanhar as mais recentes tendências e empresas cada vez mais internacionais e cada vez mais globais.
A tecnologia não está nem poderia estar alheada desta realidade e, por isso, penso que o modelo canónico da contabilidade é, neste momento, mais um modelo canónico tecnológico da contabilidade.
O modelo canónico tecnológico da contabilidade
Pelo menos desde 2005, estudos e publicações internacionais, sugerem a utilização de standards internacionais de modelos de dados estruturados para troca de informação. Seja ela relativa a faturação ou contabilidade.
Entre eles destaca-se o Ficheiro SAF-T, standard internacional publicado pela OECD – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico, um ficheiro normalizado de auditoria tributária para exportação de dados.
Tal como a um filho, vários países adotaram este ficheiro, sendo Portugal um dos primeiros, como um instrumento de obtenção de informação de natureza contabilística e fiscal.
Se, inicialmente, o enfoque era na informação de faturação mais recente as autoridades fiscais de cada país perceberam as potencialidades de informação estruturada contida num ficheiro SAF-T da contabilidade.
Neste sentido, adotaram também o conceito de Taxonomias que, na realidade, é um conjunto de códigos previamente estabelecidos que representam as contas da contabilidade do plano de contas da entidade.
As taxonomias
As Taxonomias permitem manter alguma elasticidade na definição dos critérios contabilização, mas na verdade têm como objetivo principal garantir que a informação exportada está de acordo com as normas, num formato estruturado e que poderá auto preencher formulários contabilísticos e fiscais.
Atualmente as utilizações dadas aos ficheiros SAF-T com informação contabilística estruturada já ultrapassam os propósitos para os quais o ficheiro foi criado. Só a título de exemplo, o trabalho de auditoria é hoje muito mais facilitado tendo por base ferramentas tecnológicas de leitura e de validação.
E aí está o que, na minha opinião, se poderá considerar o modelo canónico tecnológico da contabilidade.
O modelo canónico da contabilidade suportado em tecnologia
Sabemos que, durante muito tempo, a contabilidade, à sua maneira, tinha um modelo canónico da informação, com base nas contas dos planos de contas.
Sabemos também que o ficheiro SAF-T da contabilidade se transformou no modelo canónico tecnológico da contabilidade com a informação contabilística representada através das Taxonomias.
Por tudo isto diria que, se por um lado, no momento atual, o modelo canónico tecnológico da contabilidade permite a comunicação de informação fiscal e contabilística entre os contribuintes e as autoridades fiscais garantindo a conformidade dos dados de reduzindo os tempos de cumprimento das obrigações declarativas.
Por outro lado, o futuro ainda nos reserva algumas (diria mesmo muitas) oportunidades no desenho de ferramentas tecnológicas para suportar processos de análise descritiva, análise preditiva e análise prescritiva.
Por fim, o modelo canónico da contabilidade está aí e já está suportado em tecnologia.
Sobre o autor
Pedro Montez | Tax Technology Manager na PRIMAVERA Business Software Solutions
Fiscalidade, Contabilidade e Tecnologia são os meus nomes do meio. Trato os Códigos Fiscais por tu e todos os dias tenho na mesa de cabeceira o Diário da República. O Orçamento de Estado é o meu filme mais aguardado da temporada e navego sem medo nas ondas da tecnologia dos sistemas de informação.
A juntar à paixão pelos temas fiscais e tributários, adoro escrever, traçando paralelismos e pontos de encontro entre realidades aparentemente opostas. Nos meus artigos encontrará um estilo muito peculiar, rico em informação útil que irá contribuir para a gestão diária da sua empresa.